Categorias
Notícias

Balanço do projeto “Semanas de Internacionalização da UFRJ”: uma pioneira experiência de internacionalização da extensão na UFRJ*

Projeto mobilizou estudantes nacionais, internacionais e setores da UFRJ, buscando o caminho da consolidação da internacionalização.

De maio de 2022 a maio de 2023, a Superintendência Geral de Relações Internacionais (SGRI) teve a pioneira experiência de coordenar um projeto de extensão intitulado “Semanas de Internacionalização da UFRJ”. Por delegação do professor Amaury Fernandes, então superintendente geral de relações internacionais e idealizador do projeto, coube a mim atuar como coordenador e liderar uma equipe composta por 22 membros, dentre discentes, docentes e técnicos-administrativos. Findado o período de vigência do projeto, pretendo efetuar, nas próximas linhas, um breve balanço, destacando as atividades realizadas nesse ínterim, os objetivos alcançados e as perspectivas futuras para a chamada internacionalização da extensão na UFRJ.           

Considero imprescindível, em um primeiro momento, tratar mais detalhadamente do conceito de extensão em si. A Constituição Federal ,em seu artigo 207, estabelece o princípio da indissociabilidade entre o ensino, a pesquisa e a extensão no sistema de ensino superior brasileiro. Enquanto os dois primeiros pilares do chamado “tripé universitário” costumam ter seu significado melhor apreendido, tanto pelo público da Academia quanto pelo senso comum, o terceiro pé, conquanto teoricamente equiparado aos demais em um mesmo nível de importância, é amplamente incompreendido e, não raro, secundarizado. A extensão, em linhas gerais, denota um movimento de articulação da universidade e do saber ali produzido com as chamadas comunidades externas, ou seja, as parcelas do público e da sociedade que não estão diretamente vinculadas à universidade. São as pessoas que não trabalham ou não estudam na universidade, e que nem por isso devem estar completamente apartadas das atividades universitárias, ou que não devam ser incluídas no processo de produção e disseminação do saber universitário. A extensão pressupõe que o papel da universidade pública brasileira não se esgota na formação de profissionais, mas inclui uma função mais assertiva de promoção de um desenvolvimento sócio-econômico que não prescinde do envolvimento contumaz e continuado com os entornos sociais. A universidade, dessa maneira, atua como uma força transformadora.

Segundo a Pró-Reitoria de Extensão da UFRJ (PR-5), a extensão universitária pode ser  compreendida como “um processo interdisciplinar educativo, cultural, científico e político que promove a interação transformadora entre universidade e outros setores da sociedade”. A UFRJ, segundo indicadores da própria PR-5, possui mais de 1800 projetos de extensão, os quais possibilitam essa interação transformadora entre a universidade e as comunidades externas. Como uma instância puramente administrativa (não-acadêmica), a Superintendência Geral de Relações Internacionais não havia, até o presente momento, se dedicado mais diretamente a projetos de extensão, ocupando-se, quando muito, em celebrar parcerias internacionais que, dentre seus objetivos, possibilitavam a realização de projetos de extensão em modalidade colaborativa. Esse cenário mudaria em 2022, quando a SGRI passaria a coordenar um projeto de extensão intitulado “Semanas de Internacionalização da UFRJ”.

A ideia original, concebida pelo professor Amaury Fernandes, seria realizar periodicamente na UFRJ uma série de atividades educativas e culturais abertas à participação do público externo que partilhassem de um tema comum, envolvessem parceiros e colaboradores internacionais e fossem distribuídas no formato de uma semana, aqui compreendida como um período de três dias, e não de cinco, considerado como demasiado para uma execução satisfatória. Assim sendo, foi promovida a primeira das semanas, a “Semana da Lusofonia”, ocorrida de 03 a 05 de maio de 2022. O objetivo principal do evento foi estimular encontros e debates sobre arte e cultura nos países lusófonos e debater aspectos relacionados ao ensino da língua portuguesa. A Semana da Lusofonia foi viabilizada por intermédio de uma parceria entre a UFRJ, representada pela SGRI e pela Escola de Comunicação (ECO), e o Consulado-Geral de Portugal e o Instituto Cultural Luís de Camões. As atividades da Semana da Lusofonia ocorreram em formato remoto, e o último painel foi transmitido diretamente a partir das instalações do Consulado Geral de Portugal no Rio de Janeiro. As gravações encontram-se disponíveis no canal do Youtube da Escola de Comunicação (Escola de Comunicação UFRJ – Playlist Lusofonia). Como inscritos regulares, o evento alcançou cerca de 60 pessoas, dentre membros internos e externos à UFRJ.

Em seguida à Semana da Lusofonia, foi realizada a I Semana da Integração do Estudante Estrangeiro. Essa atividade teve como público-alvo principal os estudantes estrangeiros recém-chegados à UFRJ. A exemplo da Semana da Lusofonia, também a I Semana da Integração do Estudante Estrangeiro ocorreu em três dias. O primeiro deles, dia 26 de agosto de 2022, ocorreu de forma remota, e incluiu a oferta de um painel virtual em que integrantes do projeto conversavam com os estudantes, compartilhavam informações sobre a UFRJ e a vida na cidade do Rio de Janeiro, e dirimiam dúvidas. Já os demais dias, 29 e  30 de agosto de 2022, incluíram atividades presenciais, no campus Cidade Universitária e no Campus Fundão. Foram realizadas atividades tais quais: passeio de ônibus na Cidade Universitária, para visita a locais de interesse e conhecimento da história da universidade; caminhada ecológica na Ilha do Catalão; atividades interativas conduzidas no auditório da Inovateca (Parque Tecnológico), incluindo apresentações institucionais, quizzes sobre o Brasil e sobre o Rio de Janeiro e brincadeiras conduzidas por estudantes da UFRJ, do Grupo Interpoli (coletivo da Escola Politécnica que recepciona os estudantes estrangeiros). Já no Campus da Praia Vermelha os estudantes fizeram uma visita ao Palácio Universitário, à biblioteca Eugenio Gudin, também para que pudessem familiarizar com o Sistema de Bibliotecas da UFRJ, e um passeio cultural à Praia Vermelha, incluindo uma caminhada pela Pista Cláudio Coutinho. O evento prestou-se ao acolhimento dos novos estudantes estrangeiros, à sua integração à universidade e à cidade do Rio de Janeiro, à formação de uma rede de apoio ao público estrangeiro constituída por estudantes e servidores da UFRJ, à provisão de informações de utilidade, ao conhecimento e à visita de espaços da UFRJ, para fortalecimento do vínculo com a universidade, e ao estímulo à socialização com os estudantes brasileiros. Dela participaram 78 estudantes estrangeiros.

Em março de 2023, com o fito de alcançar um novo público de intercambistas, foi realizada uma nova edição da Semana da Integração do Estudante Estrangeiro. A segunda edição contou com as mesmas atividades da primeira, acrescidas de uma atividade conjunta com um outro projeto de extensão da UFRJ, o Comunidança, que resultou na oferta de uma mini aula de ritmos brasileiros aos estudantes estrangeiros, além da visita a dois importantes laboratórios da UFRJ, o LABEst e o NUMATS. Assim, os estudantes puderam conhecer um pouco mais da vertente da inovação e da produção tecnológica da universidade. A II Semana de Integração do Estudante Estrangeiro ocorreu nos dias 27, 28 e 29 de março de 2023, todos em formato presencial, e compreendeu um público de 49 estudantes estrangeiros. A novidade em relação à primeira edição foi a participação de estudantes estrangeiros de diplomação plena, oriundos do Programa de Estudantes-Convênio de Graduação (PEC-G) e do Programa de Estudantes-Convênio de Pós-Graduação (PEC-PG), voltados a estudantes do Sul Global, sobretudo de países da África e da América Latina. Pela primeira vez, estudantes desses programas, coordenados respectivamente pela Pró-Reitoria de Graduação (PR-1) e pela Pró-Reitoria de Pós-Graduação (PR-2), puderam estar presentes em um evento de acolhimento promovido pela SGRI e se integrar com os demais estudantes estrangeiros em intercâmbio e com estudantes da UFRJ participantes do projeto.

Já em novembro de 2022, em uma atividade destoante do formato originário das “semanas”, foi realizada uma visita à Escola Municipal O’Higgins, localizada no bairro de Bangu, Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro. Na ocasião, integrantes do projeto de extensão visitaram a escola na companhia de oito estudantes estrangeiros em intercâmbio na UFRJ, com o intuito de promover uma interação intercultural entre eles e estudantes de duas turmas do quinto ano, compreendendo crianças de dez a onze anos. Na ocasião, os estrangeiros levaram fotografias da época em que eram crianças e ali eles puderam conversar e trocar experiências sobre infância, brincadeiras, sonhos e afetos. Foram realizados jogos como uma dinâmica em que o estrangeiro tinha seus olhos vendados e precisava adivinhar o objeto descrito pelas crianças. Ao final, o estudante ensinava às crianças o nome daquele objeto em sua língua materna, gerando também uma troca em termos linguísticos. As crianças ainda tentavam adivinhar o país de origem dos estrangeiros a partir de dicas, e dessas trocas surgiram uma expansão de horizontes de ambas as partes. As crianças do quinto ano puderam conhecer pessoas dos mais longínquos países, alguns dos quais elas nunca haviam ouvido falar, e tiveram um pequeno aperitivo da diversidade linguística e cultural do mundo. Já os universitários puderam conhecer e interagir com crianças brasileiras, de uma área de realidade sócio-econômica bastante diversa dos circuitos turísticos que eles estão habituados a frequentar na cidade do Rio de Janeiro, conhecer seu espaço de sala de aula e inclusive disfrutar da mesma refeição que eles, uma vez que todos almoçaram no refeitório da escola. Muitos dos intercambistas descreveram a experiência como um dos pontos altos de seu intercâmbio a UFRJ. A visita teve um alcance de público de 60 crianças e 8 estudantes estrangeiros.

Finalmente, em maio de 2023, aproveitando a vinda da professora argentina Rosana Eisaguirre, da Universidad Nacional del Noroeste de la Provincia de Buenos Aires (UNNOBA), foi proposta a realização de duas edições, no mesmo dia, de uma oficina cultural internacional sobre espanhol e cultura argentina. A proposta seria de ensinar um pouco de espanhol e discutir aspectos culturais da Argentina, objetivando inclusive desconstruir alguns dos estereótipos que o público brasileiro costuma nutrir sobre os argentinos. A fim de que se pudesse promover uma atividade para além dos campi da UFRJ sediados na cidade do Rio de Janeiro, que são os que mais usualmente têm acesso a esse tipo de atividade, propôs-se que a oficina fosse realizada no Campus Duque de Caxias. Assim, essa atividade teve como resultado irradiar os benefícios do projeto de extensão para um público de outro perfil, de outra localidade, que puderam conhecer e interagir com uma professora argentina, aprender um pouco de espanhol e conhecer alguns aspectos culturais da Argentina, país geograficamente próximo porém muitas vezes distante em nosso imaginário. Foram realizadas duas oficinas, uma no turno da manhã e outra no turno da tarde, ambas com três horas de duração, e foram alcançados 35 participantes, entre internos e externos.

Considero que o projeto foi extremamente exitoso como uma primeira experiência de atuação direta da SGRI no que tange à coordenação de um projeto de extensão. Pessoalmente, valoro os esforços despendidos no sentido de efetuarmos um trabalho de campo, sairmos dos limites de nossos escritórios e buscarmos a interação e a integração com esses públicos. E de superação das adversidades, mormente a falta de um orçamento para custearmos as ações do projeto. Agradeço aos inúmeros parceiros e aliados que descobrimos nesse processo: o Consulado-Geral de Portugal, o Instituto Cultural Luís de Camões, a Pró-Reitoria de Extensão (PR-5), a Prefeitura Universitária, o Parque Tecnológico, o Instituto de Microbiologia, representado pelo professor Marco Miguel, o Interpoli, o Comunidança, a Faculdade de Administração e Ciências Contábeis, representada na figura do professor Pierre Ohayon, a Escola Municipal O’Higgins,  a Direção do Campus Duque de Caxias, a professora Gisele de Amorim e a professora Rosana Eisaguirre. E a todos os demais que contribuíram e participaram das atividades, seja como participante, colaborador ou organizador.

Agradeço também a todos os membros e colaboradores do projeto, cujo empenho foi fundamental para a realização do projeto: Amaury Fernandes, Cláudia Mendes, Cláudio Pinheiro, Daniela Patti, Eduardo Neves, Fabrício Longo, Jennifer Lowe, João Araújo, Mário Feijó, Mônica Freitas e Ramon Marins. E aos estudantes extensionistas Clara Lemos, Daiane Silva, Emmanuela Archanjo, Karina Castro, Karinni Baeza , Larah Rubio, Márcio Azevedo, Maria Luiza Mirindiba, Maria Vitória Alentejano, Pietra Regis, Thais Freitas e Yasmin Alves.

Por fim, destaco que as ações de extensão aqui descritas encaixam-se como ações de internacionalização da extensão. A internacionalização universitária, segundo formulação deMarília Morosini, professora da PUC-RS e uma das principais pesquisadoras do tema no Brasil, pode ser definida como o “processo de integrar uma dimensão internacional e intercultural na Educação Superior, advindo de interações, sustentadas por redes colaborativas, em blocos socioeconômicos desenvolvidos e com outros que valores múltiplas culturas, diferenças, locais e tempos, fortalecendo a capacidade científica nacional, com o fito de ser irradiador do desenvolvimento sustentável”. Semelhante definição permite depreender que a internacionalização não é um fim em si mesmo, senão um meio para aportar, à educação superior, o desenvolvimento de competências linguísticas e interculturais, tão úteis à formação profissional e à geração de uma cidadania cosmopolita que valore as diferenças e combata a intolerância e o preconceito cultural. Ao fomentar o desenvolvimento de semelhantes competências também perante o público externo, as ações de extensão aqui referidas traduzem um dos objetivos manifestos no atual Plano de Desenvolvimento Institucional da UFRJ (PDI 2020 – 2024), a saber, a internacionalização da extensão, e aportam também para o público externo os benefícios da internacionalização, como o conhecimento cultural, a expansão de horizontes, o exercício da empatia e a inteligência cultural, compreendida como a capacidade de transitar em ambientes culturalmente diversos a partir de uma postura de diálogo e respeitabilidade. Espera-se que novos projetos de extensão possam retomar as atividades aqui esboçadas e expandi-las, fortalecendo também a internacionalização da extensão na UFRJ, e tornando a nossa universidade cada vez mais acessível também ao público externo. E que, institucionalmente, a UFRJ possa apoiar cada vez mais projetos dessa natureza, conferindo à extensão a mesma importância que a nossa Constituição atribui a ela, indissociando-a do ensino e da pesquisa.

*Texto de Guilherme Antunes, Analista de Relações Internacionais da UFRJ.

Estudantes de intercâmbio e calouros PEC-G na reserva da Ilha do Catalão.
Estudantes de graduação nacionais, de intercâmbio e PEC-G no Palácio Universitário.
Participação no evento Semanas de Lusofonia 2022.
Estudantes estrangeiros na Escola Municipal O’Higgins, em Bangu.